terça-feira, 18 de julho de 2006

Mais interrogações

Como se deve noticiar um crime?

Salientar:
A identidade e história da vítima?
Os motivos do crime?
As circunstâncias?
O desempenho das forças de autoridade?
O criminoso?

Julgo que existem duas respostas possíveis:

1ª Ao estilo do 24 Horas e da TVI.

Identificar a vítima ao som de uma músca bem triste, com imagens a preto e branco em câmara lenta; mostrar que era o único sustento de uma família com 10 filhos (somam-se sempre mais 8 aos que de facto existem) e uma mulher (de preferência inválida); entrevista-se a mulher e faz-se a inteligente pergunta "Como se sente?"; fala-se com os pais e vizinhos que contam como era um bom homem, adepto do slb (para criar mais empatia com o público) e católico praticante. Os motivos devem envolver dinheiro, um assalto, a disputa de uns terrenos, o bloqueio de um lugar de estacionamento... ou então, para ser em beleza, passionais.
As circunstâncias têm de ser as mais sangrentas possíveis. O uso de caçadeira ou arma cortante de grandes dimensões o machado, é o ideal. A morte da vítima deve ser dolorosa, ruidosa e muito lenta, verdadeiramente shakesperiana. É conveniente mostrar o local e a arma do crime, não descurando a utilização de planos que realcem as manchas de sangue.
O desempenho das autoridades deve ser profundamente criticado. Entrevista-se os vizinhos que, entre muitos "louvado seja Deus, é o fim do mundo" e "intigamente é que era bom", aludem à constante ausência da polícia numa zona muito insegura, dominada por, segundo as palvras dos mesmos, "pretos e ucranianos". As imagens de jovens de cor com roupas largas e música alta são indispensáveis. Se juntarem planos de indivíduos eslavos, de etnia cigana, carros abandonados, barracas e cães rafeiros e magros, tanto melhor.
O criminoso tem de pertencer a uma minoria (africana, eslava, cigana), sendo de idade jovem, criminoso reincidente, aproveitando uma saída precária para cometer o delito. É imperativo que esteja devidamente referenciado entre a vizinhança. Esta é filmada a dizer mal do sujeito: "Eu tenho 65 anos, estive no Ultramar e também lá vi muitos assim." ou então "Eu quando olhei para ele vi logo que era má peça! Eu sei o que digo, esses russos é só bruxedo".

A reportagem deve ser acompanhada com títulos curtos e de fácil interpretação, em letras garrafais. Em televisão, o pivot de anunciar a peça num tom alarmista (como um jeová a falar do fim do mundo), sendo acompanhado por uma imagem de fundo na qual impere um ensanguentado vermelho.

A segunda dá muito trabalho...

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